quarta-feira, 4 de maio de 2016

Funrural: Devo ou não recolher?

O Programa de Assistência ao Trabalhador Rural- PRORURAL, teve origem na Lei Complementar nº 25/71, que instituiu o direito a aposentadoria por idade, invalidez, pensão, dentre vários outros benefícios ao agricultor.

Com o advento da Constituição Federal de 1988, a estrutura previdenciária foi reestruturada, trazendo em seu art. 195, I, (posteriormente alterado pela emenda constitucional nº 20/98), dentre outras mudanças, que a base de cálculo para a contribuição previdenciária seria o faturamento do produtor rural pessoa física. Posteriormente, surge a lei nº 8.212/91 que dispõe sobre organização da Seguridade Social. E, em seguida, no ano de 1992 é promulgada a lei nº 8.540, que institui o FUNRURAL.

O FUNRURAL E SUA (IN) CONSTITUCIONALIDADE.

O Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural - FUNRURAL, objetiva financiar benefícios previdenciários ao trabalhador do campo, tendo como base de cálculo a receita bruta da comercialização de produtos rurais, ou seja, diferentemente do que estabelecia o texto constitucional à época – na qual o faturamento deveria ser a base de cálculo para apuração previdenciária (conceito menos abrangente do que toda a receita bruta), o que fez com que as leis se tornassem incompatíveis com a Carta Magna. Contudo, mais tarde, é aprovada a emenda constitucional nº 20 de 1998, que traz nova redação ao art. 195 da CF, instituindo como base de cálculo a receita bruta da comercialização.

Em uma leitura desatenta, pode-se imaginar que as leis que instituem e regulamentam o Funrural se tornaram constitucionais, em virtude da posterior emenda. Ocorre que, o ordenamento jurídico brasileiro veda a possibilidade da constitucionalidade superveniente, em outras palavras, não é possível uma lei inconstitucional passar a ser constitucional em virtude de uma emenda à Constituição Federal, conforme julgou o Supremo Tribunal Federal[1]. Uma vez incompatível, passa a ser letra morta, somente uma nova lei poderá se adequar aos novos preceitos constitucionais.

Nessa esteira, ao julgar o RE 363.852-MG, o Supremo Tribunal Federal decidiu pela inconstitucionalidade do art. 1º da lei nº 8.540/92, que modificou a lei nº 8.212/91, obrigando o produtor rural, pessoa física, que seja empregador, a recolher 2% à título de Funrural ao INSS, sobre a sua receita bruta. Outrossim, a referida lei é de natureza ordinária, versando sobre assunto reservado à lei complementar, conforme art. 195, § 4º c/c art. 154, I, ambos da CF.

Em outro Recurso Extraordinário (RE 596.177- RS), tratando do mesmo tema, o STF concedeu a repercussão geral ao assunto, decidindo, também, pela inconstitucionalidade. Em efeitos práticos, com o reconhecimento da repercussão geral desse segundo recurso extraordinário, tal decisão passa a vigorar para todos aqueles que ingressarem com ação tratando de mesma temática.

No entanto, a discussão não está encerrada, pois, o Supremo só declarou incontestável inconstitucionalidade no que tange ao Funrural pago pelo produtor rural pessoa física, empregador. Cabe, ainda, julgar o tocante ao produtor rural em regime familiar e o produtor rural pessoa jurídica. A jurisprudência referente a estes últimos, não é, no momento, tão robusta quanto ao primeiro, no sentindo de desobriga-los do recolhimento do tributo.

QUEM DEVE RECOLHER O FUNRURAL?

Em conformidade com a Constituição Federal e a legislação infraconstitucional, devem recolher o FUNRURAL, em regra, três categorias de produtores rurais:

O primeiro, é o produtor pessoa física, sem empregados, conhecido também como produtor em regime familiar (art. 195, § 8º da CF). Seja ele proprietário, parceiro, arrendatário ou meeiro deverá recolher a aludida contribuição previdenciária, sendo 2% destinado ao INSS, 0,1% ao RAT- Riscos Ambientais do Trabalho, mais o percentual de 0,2% ao SENAR, embora esta última não pertencer ao Funrural, é paga na mesma Guia de Previdência Social (GPS).

O segundo, é o produtor rural pessoa física, proprietário ou não, que conte com auxílio de empregados, nos mesmos percentuais do produtor em regime familiar. (art. 12, V, a, lei nº 8.212/91).

O terceiro e último caso, é do produtor pessoa jurídica (agroindústria), cuja atividade econômica seja a industrialização de produtos próprios ou adquiridos de terceiros, no percentual de 2,5% à título de Funrural, sobre a sua receita bruta proveniente da sua comercialização. (art. 22A, lei nº 8.212/91).

A PARTIR DO POSICIONAMENTO DO STF, QUEM DEVE CONTINUAR RECOLHENDO FUNRURAL?

O Supremo Tribunal Federal ao reconhecer a inconstitucionalidade do art. 1º da lei nº 8.540/92[EFA1], dando efeito de repercussão geral, desobriga a retenção e recolhimento do Funrural devido pelo agricultor pessoa física, que conta com auxílio de empregados, até que uma nova legislação seja promulgada em conformidade com a Emenda Constitucional nº 20/98. Sendo assim, todo agricultor que se enquadrar nessas condições, poderá pleitear judicialmente a restituição dos últimos 5 anos e a interrupção do pagamento.

Quanto ao agricultor pessoa jurídica e o em regime familiar, por ora, é necessário ter cautela. A Suprema Corte ainda não julgou o RE nº 761.263 – SC de repercussão geral, que irá dar um posicionamento quanto ao assunto, decidindo pela constitucionalidade ou não do recolhimento do Funrural por parte desses contribuintes, até que uma lei complementar seja aprovada.

CONCLUSÃO

Diante do exposto, conclui-se:

O Supremo já pacificou o entendimento de que o agricultor, que seja empregador, pode pleitear judicialmente a interrupção do pagamento do Funrural e uma possível restituição dos últimos 5 anos contribuídos.

Desse modo, passa a recolher em contrapartida o INSS, sobre a sua folha de pagamento. E, em caso de pedido de restituição, terá que pagar o valor que seria devido a título de INSS, referente ao período que pretende restituir. Portanto, é indispensável fazer uma análise da viabilidade econômica de se ingressar com tal medida judicial.

No que se refere ao Funrural do agricultor em regime familiar e da pessoa jurídica, ainda não há entendimento pacificado. Cabe aguardar julgamento do STF. Porém, nada impede que se ingresse com uma medida para tentar reverter a presente situação. O direito do agronegócio, alinhado ao direito tributário, tem ganhado cada vez mais força perante os poderes judiciário e legislativo, na busca da efetivação dos direitos do campo.

(Autor: Rodrigo Klein/Jusbrasil)

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