quarta-feira, 27 de dezembro de 2017

O produtor rural terá o direito de portar armas em 2018?

Fim do Estatuto do Desarmamento marcou as discussões em 2017, mas projetos sobre porte ainda não foram aprovados

Cerca de 33% dos crimes em propriedades rurais são realizados em áreas a mais de 20 quilômetros de distância da sede do município em que se localizam. O dado é do Observatório da Criminalidade, criado pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) para tentar mapear as ocorrências no meio rural, por meio de uma pesquisa feita com produtores no início deste ano. O setor de pecuária é o mais visado pelos bandidos, sendo que o furto de animais representa 34% dos casos.

O estado que lidera no número de casos é Minas Gerais, seguido da Bahia. De acordo com a Polícia Civil, mais da metade das ocorrências registradas no Triângulo Mineiro está relacionada a furto de gado, e em boa parte dos casos há envolvimento de funcionários da propriedade.

O produtor rural Julianderson de Paiva Roriz diz que sua fazenda, que passou de geração para geração, começou a ser roubada quando ainda pertencia ao avô dele. “A família do meu primo, que é nosso vizinho, também foi assaltada há uns quatro anos. Bateram na mulher dele e nele. A filha dele ficou traumatizada e eles mudaram para a cidade”, conta.

A bancada ruralista defende que a posse de arma de fogo na fazenda pode evitar um crime. O deputado federal Heitor Schuch (PSB-RS) diz que o grupo sabe que é um assunto polêmico e que há muita gente contra, mas afirma que é necessário ser resolvido de uma vez por todas.

“A insegurança campeia solta pelo Brasil afora. As pessoas que moram longe são as que mais têm dificuldade de comunicação, de telefonia, de acesso às políticas públicas, à segurança. Os marginais já descobriram que fazer o que não se deve longe da polícia, lá no interior, tem uma facilidade muito grande”, afirma Schuch. 

Projetos de lei 

Atualmente cinco projetos de lei sobre o armamento no campo tramitam no Congresso. Três pretendem alterar o Estatuto do Desarmamento, um prevê um plebiscito para consultar a população sobre a revogação do Estatuto, lei criada em 2003, e o outro é um projeto individual que cria o porte de arma no campo.

O plebiscito está na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado para ser votado. O Projeto de Lei proposto neste ano pelo deputado federal Heuler Cruvinel (PSD-GO), aguarda votação na Câmara dos Deputados. Já o Projeto de Lei do deputado Wilder Morais, que modifica o Estatuto do Desarmamento e o projeto individual de Afonso Hamm, de relatoria do deputado Alberto Fraga (DEM-DF), seguem para votação no Senado, em 2018.

Fraga defende que basta que somente o seu projeto seja votado para que a lei entre em vigor. “É o mais completo porque fala na posse e no porte, e obedece a legislação prevista no Estatuto do Desarmamento. O projeto do Senado só permite a posse, ou seja, dentro de casa, e você falar isso em uma fazenda não vai atingir o objetivo que talvez o próprio autor do projeto quisesse ter, por isso que nós temos uma certa preferência pelo projeto da Câmara que está mais completo”, diz. 

Os ladrões rurais têm apostado na impunidade, já que 66% das propriedades foram vítimas de reincidência. Diante disso, o presidente da Associação dos Produtores de Soja do Brasil (Aprosoja Brasil), Marcos da Rosa, diz que as pessoas que tiverem o treinamento com arma e passarem pelo teste dizendo que estão aptas devem receber permissão.

“Por que as pessoas estão entrando na nossa propriedade? Porque elas sabem que lá não tem nenhuma defesa. Elas – através da incompetência do Estado – com armas que vem importadas de outros países e com um interesse financeiro enorme. Quem é bandido está armado. A sociedade civil está desarmada. Então, é uma necessidade”, defende Rosa. O ministro da Justiça, Torquato Jardim, se manifestou a favor do armamento em uma audiência pública no Congresso. 

“É um tema que temos que enfrentar com absoluta honestidade proposta, absoluta honestidade de fato. Se em um sítio, nos arredores de São Paulo ou Belo Horizonte isso pode ser dispensável, há fazendas na Amazônia, Goiás, Tocantins, que eu conheço bem, em que não raro a arma é garantia de vida”, diz.

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) não concorda com os projetos de lei em andamento. Para a entidade, seria redundante aprovar um projeto de uma lei que já existe. Djalma Nogueira dos Santos Filho, membro da Comissão de Direitos Humanos do Distrito Federal, diz que o estatuto já trata matéria e garante a todo cidadão garantir um armamento. 

“Para mim é redundante criar uma categoria de cidadão diferente, e não acrescenta nada. Ao contrário, parece-me inconstitucional, porque pela Constituição todos são iguais perante a lei. Não vejo motivo jurídico para essa distinção”, argumenta. 

Para Santos, a utilização de arma no setor rural não é para a defesa do produtor e sim para utilização no cotidiano da fazenda. “Eu vejo que é uma condição que os trabalhadores rurais historicamente tiveram. Um animal peçonhento, um problema com um boi desgarrado ou até mesmo para o abate de um animal para consumo próprio; o uso é mais para isso,” afirma. 

Santos defende que o correto é melhorar as condições da polícia brasileira. “Essa questão de armar a sociedade para se defender é perigosa e, ideologicamente, muito atrasada. Quer ter segurança? Vamos avançar nas conquistas sociais, aparelhar a polícia, os conselhos tutelares, vamos trabalhar na organização da sociedade. Esse é o caminho”, afirma. 

Alternativas 

Enquanto a matéria não anda no Legislativo, outras alternativas foram pensadas, como a Patrulha Rural Georreferenciada, criada pela Federação de Agricultura e Pecuária de Goiás (Faeg), em parceria com a Polícia Militar. 

O projeto visa otimizar a comunicação e a agilidade da PM. As fazendas cadastradas no programa tem a localização inserida no GPS, onde armazena todas as rotas para a viatura chegar mais rápido na ocorrência. 22 municípios goianos já contam com o programa de patrulhamento. A expectativa é atingir 60 municípios até o final de 2018. 

“Os resultados têm sido extremamente significativos. Há alguns municípios em que as ocorrências caiu em até 80%”, conta o vice-presidente da CNA, José Mário Schreiner. No entanto, ele também não descarta a mudança na lei como ferramenta para combate a criminalidade. O meio rural por si só é um meio muito visado pelos bandidos, por isso que nós vislumbramos também a revisão do Estatuto do Desarmamento, com a possibilidade dos produtores portarem armas,” diz.

(Canal Rural)


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